Deuses da Mitologia Coreana: Os Mitos Fundamentais
- Dramalize
- há 2 dias
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A Coreia, com sua história milenar e riqueza cultural, possui uma mitologia vasta e fascinante, tecida por séculos de tradições xamânicas, influências budistas e crenças populares.
Conhecer esses mitos é como abrir uma janela para a alma de um povo, compreendendo suas visões de mundo, suas esperanças e seus medos.
Prepare-se, pois hoje você vai conhecer alguns dos deuses e deusas mais significativos da mitologia coreana, aqueles cujas histórias ecoam através dos rituais xamânicos e das canções ancestrais.
Maitreya e Sakyamuni: Os Arquitetos do Gênesis
Vamos começar com os deuses do Gênesis, figuras colossais que surgem em rituais xamânicos de grande escala. Embora seus nomes – Maitreya e Sakyamuni – nos remetam ao budismo, muitos estudiosos especulam que eles podem ter tido nomes locais originais antes da assimilação.
Entre esses dois deuses criadores, Maitreya se destaca como o principal arquiteto da criação. Foi ele quem liderou o grandioso ato de moldar o Céu e a Terra, e, posteriormente, a criação dos próprios humanos.
É intrigante notar como os mitos descrevem a formação da humanidade de maneiras distintas: em "Ch’angsega" (Canção da Criação), Maitreya utiliza dez insetos, uma representação do evolucionismo; já em "Ssaeng Kut" (Um Rito Xamã do Deus Xamã), ele emprega argila, uma clara alusão ao criacionismo. Duas visões que coexistiam nesse conjunto de crenças.
Sakyamuni, por sua vez, entra em cena após o mundo e os humanos já terem sido criados por Maitreya. No entanto, é ele quem assume o controle do universo.
Seu papel, um tanto controverso, é explicar a proliferação do mal no mundo humano. De acordo com o mito, essa disseminação do mal se deve a uma artimanha de Sakyamuni, que assumiu o domínio do mundo de forma traiçoeira.
As versões desses mitos, como "Ch’angsega" e "Ssaeng Kut", eram outrora herdadas em Hamung, na Província de Hamgyong do Sul (hoje Coreia do Norte). Infelizmente, a transmissão desses contos se tornou incerta nos dias atuais, um lembrete da fragilidade do patrimônio oral diante das vicissitudes do tempo.

Taebyolwang e Sobyolwang: Deuses do Cosmos e do Destino
Ainda no panteão dos criadores, encontramos Taebyolwang e Sobyolwang, por vezes conhecidos como Sonmuni e Humuni em outras regiões.
Suas atribuições como deuses criadores são notáveis: eles são os responsáveis por regular o número de sóis e luas no céu, livrando-se dos excedentes cósmicos.
Contudo, a dinâmica entre esses irmãos é marcada por uma incessante competição para governar os vivos. Os enredos comuns dessas histórias narram uma série de apostas para decidir quem seria o governante. Taebyolwang, o irmão mais velho, sempre vencia as disputas.
Até que, em um momento de desespero e astúcia, Sobyolwang, o irmão mais novo, propôs uma aposta final: "cultivar o vaso enquanto dormiam".
Com um engano ardiloso, Sobyolwang conseguiu vencer e, como resultado, tornou-se o governante dos vivos, enquanto Taebyolwang foi incumbido de governar os mortos. Uma história que ressoa com a dualidade da vida e da morte, do destino e do livre-arbítrio.
Versões desses mitos podem ser encontradas em "Ch'onjiwangbonp'uri" (Mito de Origem do Rei Ch'onji), "Ch'ogamje" (O Primeiro dos Ritos Xamanísticos) e "Sirumal" (Rito Xamanista para o Deus e a Deusa da Aldeia), tradições preservadas na Ilha de Jeju e na Província de Kyonggi.

Erudito Kungsan e Noiva Ilwol: A Personificação do Sol e da Lua
Os xamãs coreanos reverenciavam o sol e a lua em seus grandes rituais, não apenas como corpos celestes, mas como divindades personificadas. Acreditava-se que o Erudito Kungsan e a Noiva Ilwol, após suas mortes, se transformaram no deus do sol e na deusa da lua, respectivamente.
Embora haja alguma semelhança com o conto folclórico de "Um irmão se tornou o sol e uma irmã se tornou a lua", a essência da história dos deuses é distinta.
É fascinante observar que uma pintura de parede do período Koguryo já revelava o sol e a lua em suas formas personificadas, sugerindo que os ancestrais coreanos talvez buscassem descrever a vida cotidiana dos deuses através desses luminares celestiais. Uma forma poética de conectar o divino ao mundano.
Uma versão desses deuses, o "Ilwolnorip’unyom" (Canção da Oração ao Sol e à Lua), era herdada em Kanggye, na província de P’yongan do Norte (hoje Coreia do Norte). Assim como outros mitos, a certeza de sua transmissão ao longo do tempo também é incerta.
Princesa Pari: A Guiadora de Almas e Mãe do Xamanismo
Entre as deusas mais veneradas, a Princesa Pari, também conhecida como Paridegi, Peridegi ou a Sétima Princesa, ocupa um lugar de destaque. Ela é a figura central em rituais xamânicos destinados a guiar os espíritos dos falecidos ao submundo.
Os nomes desses rituais variam de acordo com a região – Mangmuk Kut em Kwanbuk, Saenam Kut em Seul, Chinogwi Kut nos distritos centrais, Ogu Kut em Yongnam e Ssitkim Kut em Honam – mas o propósito é um só: assegurar que os falecidos encontrem um caminho seguro para o mundo dos mortos.
A Princesa Pari é reverenciada como a deusa da origem do xamã. Sua ascensão a essa posição se deu pela sua notável habilidade de cura, evidenciada quando curou as doenças de seus próprios pais.
Além de ser uma curandeira, ela é a ponte entre os mundos dos vivos e dos mortos, viajando entre eles para guiar os espíritos inquietos ao seu descanso final. Por essa razão, ela é profundamente respeitada como a deusa dos mortos, uma figura de compaixão e orientação.
As versões que narram a história da Princesa Pari, como "Parigongju", "Paridegi" ou "Ch'il Kongju" (A Sétima Princesa), podem ser encontradas em toda a Coreia, testemunhando a amplitude de sua veneração.
Os Três Deuses Chesok e Tanggumaegi: Abundância e Proteção
Finalizando nossa exploração, encontramos os Três Deuses Chesok, adorados no ritual "Chesok Kut". Embora o nome evoque o deus budista "Chesokch’on", a função desses deuses na mitologia coreana é intrinsecamente ligada à fertilidade e à prosperidade agrícola.
Eles governam a saúde das colheitas ao longo das estações e garantem a abundância na agricultura. Sua influência se estende também à fortuna e à vida, sendo invocados nas canções rituais de oração dos xamãs.
A mudança de nome para "Deus Chesok" é atribuída à influência budista, mas sua essência como deuses da colheita, vital para uma sociedade agrícola, permaneceu inalterada.
Dentro do "Chesok Kut", há também a veneração de Tanggumaegi, uma deusa com múltiplos nomes dependendo da região, como Tankumgaksi, Sojangaegi, Sijunagi, Sejunaegi ou Chajimyongaegi. O termo "Tangkum" é uma fusão de "tan" (vila ou vale) e "kam" (deus na antiga língua coreana), significando "deus da aldeia" ou "deus do vale".
Isso sugere que, à medida que caçadores ou agricultores se estabeleciam em comunidades nos vales, Tanggumaegi se tornou a deusa protetora desses assentamentos.
Além de sua função como deusa protetora da aldeia, Tanggumaegi é também a deusa da agricultura, controlando os produtos do campo, e a deusa do nascimento, supervisionando a concepção e os partos.
Sua presença em rituais como "Chesokbonp’uri", "Tanggumaegi" e "Samt’aejap’uri" (Mito de Origem dos Três Irmãos) atesta sua importância em toda a Coreia, reforçando sua conexão com a vida, a comunidade e a abundância.
A mitologia coreana é um tesouro de histórias que refletem a profunda conexão entre o povo e sua terra, suas crenças e seus rituais. Através desses deuses e deusas, podemos vislumbrar a sabedoria ancestral e a resiliência de uma cultura que, mesmo diante de influências externas, soube preservar sua identidade única.